domingo, 14 de junho de 2009

Carta de uma mãe à um filho jovem


Filho:

O mais importante na vida é você caminhar em direção à você mesmo.

Há uma música que diz " Por tanto amor, por tanta emoção, a vida me fez assim. Manso ou atroz, doce ou feroz. Eu, caçador de mim!"

E ela continua "Nada a temer senão o correr da luta. Nada a fazer senão esquecer o medo. Abrir o peito à força, numa procura. Fugir às armadilhas da mata escura".

O Milton Nascimento poderia bem estar falando da análise.

É assim que a gente se conhece: tem que ir atrás de você mesmo, se caçar, visitar os lugares mais escuros aí dentro, não ter medo deles. Não correr da luta (ele diz que só isso devemos temer: correr da hora de lutar).

A gente encontra o que sempre soube que estava lá. Só que a gente reprimia, negava, deslocava pra outras coisas, culpava os outros, fugia, escondia, jogava embaixo do tapete.

Na análise não tem isso. É você com você mesmo. É como se você olhasse dentro de um prisma: tem que revirar todos os ângulos e cantos. Conforme você mexe, as coisas saem do lugar (como no caleidoscópio). Daí você vai pra casa e pensa e sente. E não consegue entender, porque ao mexer, saiu do lugar.

Volta na terapêuta e diz que não entendeu e mexe de novo, dói e a gente chora e grita. Fica com raiva dela, porque "ela" é que é isso ou aquilo...vai pra casa, morre de raiva, mas volta no horário seguinte, porque não parou de mexer no assunto e pensar e sentir.

E assim vai. A mãe entre nessa ciranda de raiva e amor, o pai entra, os irmãos, o mundo, as notícias da tv, a vida que é injusta, o dinheiro que nunca basta, e assim por diante.

A gente sofre e chora tudo que tem pra chorar de frustração para com o mundo e os outros.

A gente odeia e se encolhe, porque ninguém entende a gente. A gente tem pena da gente mesmo e se odeia.

Mas sempre sai disso e a vida lá fora da terapia está rolando, o sol está brilhando, a crise econômica continua igual.

As pessoas estão vivendo e morrendo. E a gente está em outra dimensão: a que é exclusivamente sua.

Você vai entrar num mundo só seu. E encontrar seus monstros e heróis. Você vai odiar o que encontrar, mas vai querer voltar lá, mais e mais, porque você quer saber o que tem do outro lado.

Afinal, você quer saber quem você é de verdade.

Saber aquilo que você consegue e principalmente aquilo que você não consegue fazer. Saber o que tem que fazer pra conseguir. Sofrer com a impotência e arrumar forças pra vencê-la. Ou aceitá-la tranquilamente e partir pra outra. E ainda assim continuar sendo você mesmo. O tempo todo.

Todo o mundo está lá fora e nem percebe a sua luta.

Mas você está lá: bravamente lutando. Desesperadamente lutando, até.

E só revirando cada canto escuro do teu prisma que a tua luz vai sair multicolorida e linda do outro lado de você mesmo.

Não tem outro caminho. Só esse.

Você vai lutar contra você mesmo e à cada luta vai sair mais e mais fortalecido. Não é a luta do bem contra o mal, que isso a religião criou pra sacanear as pessoas.

Você vai lutar contra a frustração, a pena de você mesmo que te mantém paralisado. Vai lutar contra a sua autocritica que te pune e vai aprender a se aceitar melhor. A se perdoar e se amar, não deixando que a culpa te castigue.

Aqui fora as pessoas até podem reclamar. Vão reclamar que você não é mais o mesmo. Que você está malcriado ou egoista. Que você não dedica mais o tempo que dedicava à elas antes.

Mas isso é em vão. Elas reclamam, porque estão te perdendo, estão perdendo as regalias que tinham, enquanto te controlavam, enquanto você está se ganhando pra você mesmo. Vão reclamar, sim, enquanto você está se fortalecendo, se entendendo e aprendendo a dizer NÃO aos parasitas, aos encostados (que adoram se jogar em cima dos outros para os outros carregarem).

Você vai aprender a ver teu prisma e deixar tua luz brilhar e vai aprender a reconhecer isso nas pessoas. Isso vai te ajudar a escolher melhor as companhias e a escolher pessoas e situações que te ajudem a crescer e se desenvolver e a rejeitar aquelas que te escravizam.

Suas decisões serão maduras e mais acertadas, porque você estará consciente, lúcido e com os olhos bem abertos. Como Sidarta que chegou à iluminação.

Primeiro ele saiu do palácio, descobriu a miséria, a dor, a morte e se tornou asceta. Não comia, nem bebia e só meditava.

Até que ouviu um mestre dizendo ao aluno: "Se você apertar a corda do violão demais, ela se rompe. Se você deixar a corda muito frouxa, ela não emite seu som. Precisa apertar a corda no meio, na medida certa."

Sidarta entendeu que o Caminho do Meio era o caminho certo. E meditou. E venceu a ilusão, venceu o medo, venceu a frustração, porque se colocou para além dos bem mundanos e das vaidades.

E assim chegou à sua luz própria, ao NIRVANA. E daí passou a ser chamado de "BUDA" que quer dizer "o iluminado".

O caminho do teu nirvana está à sua frente e dentro de você.

É só seguir que a gente te espera lá do outro lado do túnel, filho!

A gente te espera onde a gente sempre esteve: aqui fora!

Te amo incondicionalmente.


Como sempre foi.


Como sempre será.


MÃE.

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