domingo, 9 de agosto de 2009

Pais e mães solteiros


Vivemos uma época em que ser solteiro virou opção de vida.

Ontem eu li uma matéria que falava sobre mulheres solteiras e uma delas disse: "sou solteira, o que é difente de estar solteira".

Ser solteira é escolher a vida dessa forma e estar solteira é um estado de transição, enquanto se espera outro alguém chegar. Outro alguém que se encaixe no seu sonho, como disse Cazuza.

Há algumas semanas uma revista publicou matéria de capa sobre o aumento de pessoas sozinhas que trocaram os amigos reais por amigos virtuais. Claro que as faixas etária e socioeconomica são as mesmas da matéria de ontem.

Conviver com outras pessoas sempre foi difícil. É só pensarmos em nossos avós e quando diziam sobre a dureza da vida e da necessidade de emprestar dinheiro, por exemplo. Sempre fui de família pobre: meu avó paterno moldou calçadas e praças da cidade de São Paulo com as mãos e meu avô materno era capataz de fazendas.

As pessoas dos séculos XIX, XX tinham personalidade. Explico: ao emprestar dinheiro de alguém a pessoa empenhava a palavra e a honra. Aquilo que a gente ouve sobre "tirar um fio da barba". Hoje, ao ouvir isso as pessoas riem sobre a ingenuidade em se acreditar no fio de barba de alguém como empenho de compromisso para pagar a dívida. Porém naquele época isso significava a honra empenhada.

Hoje as pessoas não sabem o que é honra. Nem o que é dignidade e compromisso moral.

Você já se ocupou em pensar sobre essas três palavras?

Eu estava falando com meu filho ontem sobre sermos moralmente guiados e o quanto isso nos distancia dos demais. Acabamos sendo os "chatos" ou os "radicais" onde vamos. Moral não é aquela da igreja que censura a expressão humana.

Moral são os princípios pelos quais se pensa a vida humana e tudo que a dignifica e honra. Pessoas se alimentando do lixo é imoral, bem diferente de se dizer que o adultério é imoral.

Somos moralmente guiados, quando não aceitamos a indignidade humana, a falta de respeito pela vida e existência de todos. Se o comprimento da saia está curto ou se as pessoas não se comportam isso é falsa moralidade ou moralidade burguesa e invenção de pessoas que se dizem puritanas, o que ninguém é, basta lembrar dos escândalos de padres pedófilos no mundo todo.

Ser solteira hoje tem a ver com a decisão de não aceitar a falta de dignidade e de compromisso que se estabeleceu como norma. Relacionar-se com alguém nunca foi fácil e as pessoas se sufocam em casamentos que são fugas da realidade, como se isso resolvesse alguma coisa.

Casamentos hoje ainda são arranjos financeiros, como sempre foram desde a época em que a família escolhia o noivo e as posses da família dele, para não perder a riqueza com um casamento que poderia falir economicamente a família da noiva.

Hoje é um arranjo para pessoas que ganham pouco e querem muito e fuga emocional da vida de batalhas lá fora.

A formação da personalidade das pessoas passou por profundas alterações desde a revolução industrial e as transformações do capitalismo. Conforme as relações sociais mudaram para relações fragmentadas (muito em função da Divisão Social do Trabalho), as pessoas começaram a mudar, de acordo com o acesso que tinham à sua parcela na sociedade.

A família perdeu a força, porque pai e mãe foram para a rua trabalhar. Os exemplos familiares e morais deixaram de ser transmitidos pelos pais e passaram para a escola ou a empregada doméstica que cuidava dos filhos. E pior ainda, para a televisão.

Somos uma geração sem personalidade.

Não sabemos o que é ter caráter e palavra. Somons fragmentados, assim como os processos de fabrição de massa de tomate: cada um faz uma parte, para não dominar a compreensão do processo como um todo.

Talvez a legião de pais e mães solteiros de hoje seja uma forma de rebelião contra a falta de personalidade e moralidade vigente.

Talvez seja somente um reflexo de personalidades frágeis que não tenham estrutura suficiente para a convivência.

Talvez seja um movimento altamente narcísico e encapsulado, de evitação do contato, da vida compartilhada.

Talvez, ainda, possa ser o último brado da autonomia individual daqueles que se sentem perdidos num mar de gente sem sentido e sem valor, mas que querem dar valor à sua e à de alguém mais.

Talvez possa significar muita coisa ainda.

2 comentários:

Anônimo disse...

Concordo com td isso. Sempre que vejo alguém rindo da ingenuidade de outro, só pq aquele confiou em demasia, fico triste. Hoje em dia, confiar nas pessoas é sinônimo de ingenuidade. Acho que aprendemos muito com o passar do tempo.Mas também perdemos mta coisa pelo caminho.

Michele Matos disse...

E essa Legião de pais e mães solteiros também mostra que somos livres e capazes de abrir mão da formação "perfeita" de uma família.